Essa
é uma história de 4 amigos totalmente diferentes uns dos outros que se uniram
por necessidade e se separaram por política. E por uma reconstrução magnifica,
voltaram a conciliar.
Caso
não fosse o ambiente tóxico da polarização política, eles não teriam se
desentendido ao ponto de pararem de se falar. Porém, também não teriam o ensinamento
de autoconhecimento ao dar valor ao que realmente importa na vida: fazer parte
e ficar perto de quem gosta. Para saber quem realmente importa, é preciso
testar. E foram testados sem parar.
É
impressionante que a necessidade pode ser muito útil para realizar uma junção
que não seria capaz em outras condições. Condições impostas na sociedade em que
o “eu” comunica-se com o outro e o todo se faz o consenso de familiaridade. E
essa aproximação gera uma família moderna, que é aquela constituída e construída
e não formada por genética.
No
segundo semestre de 2021 os quatro universitários, que até então não se
conheciam, precisavam dividir um apartamento próximo ao campus da universidade
[todos eles moravam longe da faculdade]. Acharam um local em que o proprietário
alugava os cômodos dentro do imóvel. Este imóvel possuía quatro quartos que,
prontamente, foram locados pelos quatro locatários.
Os
quatro locatários possuíam visões de mundo completamente diferentes. Veja só:
Debora
estuda design, usa piercing no nariz, seu signo é Áries com ascendente em Libra.
Gosta de viajar e bater foto de montão. Lê Freud. Lésbica solteira, trabalha com eventos, que,
por coincidência, também é organizadora da parada gay, cuja não perde esta
manifestação de jeito nenhum. Não tem a quem votar porque ninguém a representa
em eleição presidencial. Então tem que escolher por exclusão. E na pressão dos
colegas, é levada a votar no Lula. [o que pra ela não faz sentido nenhum]
Sandra
cursa odontologia, gosta das ideias de Tomás de Aquino, cujo defende uma fé
racional. Sempre leva a bíblia consigo. Ama ler Paulo de Tarso. Aos domingos
vai à igreja rezar. Recebe conselhos do pastor. E uma vez por ano participa da
marcha pra Jesus. Não tem a quem votar, mas vê em Bolsonaro alguém que defende
a religião.
Bruno
cursa sociologia. Com cartaz da revolução russa, além de Che Guevara no
porta-retratos, tem um pôster do Karl Marx colado na porta – cujo pensador adora
ler. Acompanha assembleias de movimento estudantil universitário e não perde
uma passeata de 1º de maio. Sempre que pode defende o proletariado, embora não
seja um. Defendeu o Lula livre e votará no seu líder na eleição de 2022.
Paulo
cursa engenharia e gosta de ler o pensador Enéas Carneiro. Concorda com a tese
das propriedades de Nióbio e Grafeno. Acha que o Brasil está sofrendo ataque
dos globalistas, o que faz o país sofrer ameaça de virar colônia do império
chinês. Participa das manifestações nacionalistas. Chama Bolsonaro de mito.
Votará no mito em 2022.
No
começo, os quatro indivíduos - embora morando no mesmo apartamento - não
interagiam entre si. Cada qual fazia a sua rotina diária, tornando a residência
um simples dormitório, no qual ficavam alojados como depósitos em seus quartos,
sem ligação nenhuma entre os moradores.
Mas
como o tempo vai passando, as coisas vão mudando.
Os
quatro jovens, diferentes uns dos outros, começam a lentamente compartilhar a
cozinha e a sala, ao se esbarrarem com mais frequência, gerando uma interação
entre os locatários e início de familiaridade entre os residentes desta
república estudantil em forma de apartamento.
Pouco
a pouco os moradores vão começando a se conhecer e a suportarem as diferenças,
gerando um armistício e tratado de paz entre as diferentes culturas que se
estabeleciam naquele lugar.
Os
elos começaram a surgir.
Debora
e Sandra gostam de filme gênero drama. As duas, vez ou outra, assistem filmes
de streaming juntas, com pipoca amanteigada do jeito que elas gostam, além de
usarem lenço para secar as lágrimas. Duas carpideiras de carteirinha.
Bruno
e Paulo descobriram que gostam do mesmo time de futebol: Santos. É Pelé pra cá,
Robinho e Neymar pra lá, saudosismos sobre os títulos do clube, além de
rivalidades contra outras agremiações. O futebol juntou o que teoricamente não
se podia juntar. Coisas da vida.
Parece
que não existe esquerda e direita quando se torce pelo Santos ou quando se assiste
filme do gênero drama. É possível entender que as inter-relações do dia a dia quebram
aquela regra conhecida: “tudo é política”. Ou seja, algumas condições esta
regra não se aplica. Não é engraçado?
Acabaram as provas finais, todo mundo foi
aprovado ao avançar de período e o ano virou. 2022 chegou.
Com
as férias, cada um foi para um lado. Cada qual gozou o seu merecido descanso
como quis. Em março, eles todos voltaram para o mesmo apartamento, que não
tinha sido ocupado por ninguém. E nesta volta parecia que já eram amigos.
Abraço aqui e acolá, como se já houvesse uma ligação entre os inquilinos.
Ao
conhecerem-se melhor, Sandra e Bruno descobriram que gostam do mesmo tipo de
comida: nachos picantes. E Debora e Paulo gostam do mesmo gênero musical: Rock progressivo.
Eles
convergiam e divergiam sobre roupa, arquitetura, pintura, arte, esporte e etc.
Os debates eram interessantes porque as visões de mundo eram diferentes. O que
enriquecia a conversa.
Tudo
corria bem até chegar o fim do primeiro semestre de 2022. Além das provas do 1º
semestre irritar os jovens estudantes, outra coisa pesava na convivência deles:
eleição se avizinhando.
E
como a loucura da polarização não dá trégua pra ninguém, a cizânia veio para
triunfar. Não teve jeito, os amigos separaram-se por causa de divergência política.
Houve briga por causa de politico de estimação. Debora e Bruno apoiadores do
Lula; Sandra e Paulo apoiadores do Bolsonaro. Com o ocorrido, todos resolveram
sair do apartamento. Muito tóxico. Separaram-se. Um novo tipo de “ele sim
versus ele não”.
Só
que a vida é surpreendente por dar algumas guinadas. Como sabido, o conviver
gera impressões sentimentais. Os universitários possuem lembranças uns dos
outros quando vão no Taco comer nachos, ao passar o olho na TV e ver um jogo do
Santos, escutar rock progressivo e assistir filme gênero drama. A lembrança
logo finca a bandeira e retoma o posto, mostrando que vem pra ficar.
A
Sandra lembra que a Debora tem transtorno por causa de problema de aceitação da
família. Debora lembra que a Sandra sofreu traumas na infância, o que faz usar
Deus e a igreja como terapia.
Bruno
lembra que Paulo foi muito pobre quando era criança e hoje luta para ter melhor
condição de vida. Paulo lembra que Bruno tem rejeição do pai rico e por isso
que é um jovem revoltado.
Sandra
vai à igreja e não vê no santuário o reconforto que tinha com a Debora.
Debora
ao trabalhar com eventos se pega a sentir falta da Sandra que sempre rezava por
ela.
Paulo
olha ao redor de uma passeata e se pergunta o porquê de estar perdendo tempo
com aquilo, sendo que a amizade que ele tinha com o Bruno era mais legal.
Bruno
na manifestação sindical pensava o mesmo que o Paulo. Sentia um peixe fora
d’agua vendo todo aquele barulho por nada, pois, queria reatar a amizade com o
novo amigo.
A
saudade bate forte.
Não
se sabe ao certo quem ligou pra quem. A única coisa que se sabe é que os quatro
amigos fizeram um acordo: não votar nem em Lula nem em Bolsonaro em 2022 e
acabar com a polarização. Voltaram para o mesmo apartamento que tinha
dificuldade de ocupação. E resolveram votar em um candidato da terceira via.
A
eleição chegou.
Foram
votar.
E
após votarem, decidiram, juntos, irem à praia pular ondinha.
E
pularam. A amizade voltou a reinar.
Essa
é uma história de:
Paulo
– Sandra – Debora – Bruno. PSDB.
Por
necessidade a amizade surgiu; por causa de política se desfez. E pelas vivências
e boas lembranças se restabeleceu mais forte do que nunca. O amor prevaleceu.
O Quarteto de Júlio César Anjos está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
Baseado no trabalho disponível em https://efeitoorloff.blogspot.com.
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