Por: Júlio César Anjos
Atenção:
O texto a seguir é apenas uma obra de ficção. Qualquer relação com a realidade
é somente mera coincidência.
Atravessou
a rua. Estava maltrapilho e famélico, indo em direção à Política Rodoviária Federal
de São José dos Pinhais. Cansado de fugir, o transeunte resolveu se entregar.
Ao identificar-se como um membro da milícia de Jairo, Jeremias negociou
proteção à testemunha em troca de delação. Neste momento, o guarda rodoviário
resolveu levá-lo para a polícia Federal de Curitiba. Chegando lá, ganhou café e
pão. E na frente dos detetives, resolveu piar.
Curitiba, 25 de Março de 2021
Detetive
Carlos, ao olhar bem no fundo dos olhos de Jeremias, perguntou-lhe:
-
Então o senhor faz parte da milícia do presidente?
-
Sim, fazia parte da bandidagem daquele senhor – respondeu Jeremias de
prontidão.
-
E o que tem para contar?
-
Isso é uma longa história.
-
Estou a todo ouvidos. Espera aí que vou ligar o gravador... Ok, pode começar.
-
Tudo começou...
***
Tudo
começou quando a operação lava-jato iniciou a caça às Bruxas na política
nacional. Desesperado, Jairo sabia que, se quisesse ser blindado tinha que cair
pra cima, teria que deixar de ser político de baixo clero para virar político
de alto escalão. Era questão de sobrevivência tanto para a sua milícia quanto
para a sua família essa salvação.
As
instituições de justiça do Rio de Janeiro deram-lhe uma colher de chá, ao
preservá-lo até conseguir se realocar eleitoralmente como governador, senador
ou até presidente. Seria o status necessário para poder blindar-se da justiça
capataz.
As
coisas foram ganhando uma dimensão gigantesca com a popularidade do miliciano,
como é sabido, fazendo o político ter condição real de ser presidente da República.
As coisas iam caminhando bem até que a milícia resolveu em março de 2018 matar
a Mariana porque sabia demais, política de oposição de Jairo, bem num momento
de intervenção militar adotada pelo presidente da época, o Tamer.
- Espera aí, a milícia do Jairo matou a Mariana? – perguntou Carlos.
-
Sim, foi a milícia do Jairo – respondeu Jeremias.
Naquele momento, Jairo sabia que até terminar a investigação a eleição já teria finalizado e já estaria blindado com imunidade como político graúdo porque ganharia a eleição.
Como
o senhor já sabe, Jairo decide concorrer como presidente e em setembro de 2018 leva
a facada, no qual realmente aconteceu de fato, desferida por um lunático que
quis mata-lo sabe-se lá por quê?, que aumentou ainda mais a sua popularidade,
ao possibilitá-lo fugir dos debates, garantindo-lhe vencer a eleição
presidencial.
A
milícia tinha um presidente para chamar de sua. Um dos seus virou presidente e
a expectava era que a milícia fosse blindada. A realidade, porém, é que o grupo
ficou mais ainda em evidência. Ou seja, piorou a situação.
Logo
após Jairo ganhar a eleição, em janeiro de 2019, o Ministério Público do Rio de
Janeiro mostrou que o presidente que acabara de ser eleito fazia parte de grupo
criminoso. Já na largada do mandato, esse escândalo maculou a aura de “honesto”
que o político criou para si. E a popularidade, gigantesca na eleição, foi se
deteriorando ao passar do tempo.
Quanto mais evidencias iam surgindo, mais Jairo ficava desesperado. E Jairo, deste modo, tomou a decisão radical: fazer a procissão.
Procissão,
no meio da bandidagem, é o próprio grupo ser extinto, com o extermínio vindo do
maior figurão ao menor, justamente para evitar a delação. Além disso, as mortes
deveriam ser diferentes umas das outras justamente para dar ar de fatalidade e
não de uma execução planejada e com marca de esquadrão da morte. ou seja, a procissão é sinônima de queima de arquivo.
Jairo,
neste instante, mandou matar os seus braços-direitos do grupo, começando do
mais comprometedor até o menos preocupante.
E
assim foi feito.
Primeiro,
morreu o mais conhecido: o Adrio do Nobre. Para dar ar de casualidade, Adrio morreu
em seu esconderijo na cidade de Salvador, no dia 9 de fevereiro de 2020, por supostamente ter trocado
tiros com a polícia local. Como milícia conhece milícia, o sentimento de
pertencimento foi fundamental na cooperação entre a polícia fluminense e a
baiana. Adrio do Nobre morto. Um a menos para o Jairo se preocupar.
O
segundo foi o Bibinho cujo rompeu com o grupo, executado no dia 14 de março de 2020, no qual, aliás, ajudou
o presidente a se eleger ao participar da greve dos caminhoneiros.
Neste momento, o detetive Carlos interrompe o delator:
-
Mas o Bibinho não morreu de infarto?
-
Não. Morreu envenenado com Ricina. Os sintomas da morte entre ataque cardíaco e
envenenamento por Ricina são semelhantes.
Então, continuando o testemunho, o outro que morreu, só que agora por suposto conflito entre fações rivais, foi o sucessor do Adrio do Nobre, o Luizo Carlo Filipa Marti, no dia 20 de março de 2021.
E,
por fim, o Queirozo ainda não morreu porque ainda está defendido por ter sido o
primeiro a ser pego em corrupção junto à família do Jairo, por esquema que eles
chamam de “rachadinha”.
O
Queirozo pode ser morto a qualquer momento por, sei lá, afogamento ou
atropelamento. O que se sabe é que os assassinos são criativos e a procissão
não pode parar. De todo modo, todo mundo sabe que o Queirozo nunca irá delatar.
Então pode ser que se salve.
E
é isso, não há nada mais para constar.
***
O detetive Carlos desliga o gravador e volta
a conversar com o Jeremias:
-
Bem, já temos tudo registrado. Não se preocupe, você está protegido ao serviço
de proteção à testemunha. Obrigado por cooperar.
-
Eu não aguentava mais ter que fugir. Estava desesperado. Obrigado por me ajudar
– disse Jeremias.
O detetive chama um policial para levar o Jeremias para uma prisão temporária dentro da PF:
-
Gerson, vem cá. Leve o senhor Jeremias para a prisão temporária aqui mesmo da Polícia
Federal.
E
ao levar o Jeremias para o cárcere, Carlos faz um último pedido a Gerson:
-
E aproveita para pendurar o crachá.
Meia
hora depois, Jeremias foi encontrado morto enforcado dentro da prisão da
Polícia Federal de Curitiba.
Jeremias, coitado, não sabia que a operação lava-jato era um braço do sistema judiciário para eleger o Jairo para presidente da nação e que a milícia está em todo o lugar, até mesmo na Polícia Federal da república de Curitiba, que diz ser contra qualquer tipo de corrupção.
Pendurar o crachá é um termo usado no meio policial para matar por enforcamento.
E
ao Jairo só resta ficar aliviado e pensar na reeleição.
***
Esse
texto fez lembrar-me da Música: “Matador”, do Gabriel O
Pensador:
A Procissão de Júlio César Anjos está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
Baseado no trabalho disponível em https://efeitoorloff.blogspot.com.
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