Guerra Fria: O Mundo de 1964 e O Mundo de 2020

Por: Júlio César Anjos

Deu n’O Antagonista a seguinte manchete: “uma nova guerra fria em meio à pandemia”. A chamada destaca a observação da organização sem fins lucrativos Asia Society, cujo relatório mostra que os ânimos de China e dos EUA estão cada vez mais acalorados neste momento de crise de saúde mundial. Sabendo dessas articulações no tabuleiro global, o Brasil certamente tem que se posicionar. Deste modo, há de observar que se houver uma nova guerra fria de fato, o Brasil não deve se alinhar automaticamente a nenhuma das duas nações pelo motivo óbvio de que o mundo atual de 2020 não é o mesmo do passado, aquele do fatídico 1964. É preciso raciocinar sobre isso.

Ciro Gomes – ele, sempre ele, o mentor da econometria embusteira! – afirma em seu bordão que o país cresceu maravilhosamente entre os intervalos de década de 1930 até 1980. Diante tal contundência do pedetista, é verdade essa afirmação? Mais ou menos. Primeiro que a elite nacional sempre fez keynisianismo inflacionário para gerar crescimento no estilo “voo de galinha”. Segundo, é preciso saber o que aconteceu no mundo neste intervalo de tempo para entender a evolução econômica do Brasil neste período a contento.

Em 1929 estourou a crise econômica que culminou na “Grande Depressão” norte-americana. Querendo ou não, os EUA só se recuperam desse baque quando a segunda guerra mundial, iniciada em 1938, eclodiu. Após devastação da Europa, a guerra fria, originada logo após o fim do conflito mundial, em 1947, ocasionou vários conflitos de guerrilha em várias partes do mundo, gerando tensões em diversas localidades do globo. Guerra do Vietnã, Coreia do Sul versus Coreia do Norte, além de independências de países que outrora eram colônias da Europa, como as nações da Argélia e Angola, moldaram e cimentaram as mudanças do mundo até 1980.

No período de 1930 até 1980, o Brasil teve duas ditaduras: a de Vargas e a Militar. Apesar de haver a revolução de 1932, a tentativa de golpe na intentona de 35, além do golpismo de fato em 1964, o Brasil não chegou ao ponto de ter uma crise econômica e uma guerra civil de proporções destruidoras, como o que ocorria no resto do mundo. Deste modo, até a década de 80, ser isolado de um mundo caótico era até uma vantagem, uma solução. Afinal, o Brasil exportava para um mundo que demandava por conflitos e crises sem cessar.

Quando a ditadura militar deu o golpe em 1964, a configuração do mundo se dava na polarização EUA x URSS. Agora, veja que interessante a observação. China era um país que tinha a sua dinâmica economia agrícola somente, com produção de arroz porque não havia instaurado a fadada “revolução cultural” que seria inserida em 1968, sendo que essa mudança política e social só começou a dar frutos a partir dos anos 80. A Europa estava devastada, tendo que se reestruturar com o Plano Marshall, em que começou a dar frutos nos anos 80. E o Oriente Médio só tinha deserto e camelo, sendo que a partir do fim dos anos 70, quando a Petrobras descobre petróleo no Iraque, a região começa a florescer a partir dos anos 80 puxada pelo ouro negro. Enfim, a convergência de reestruturação do mundo se deu nos anos 80.

Ou seja, quando o mundo começou a se organizar direitinho, o Brasil caiu em degradação. Nos anos 70, o Brasil estava a tentar executar o fatídico projeto computacional do fracassado Plano Cobra [Computadores e sistemas brasileiros], além de que, como está registrado no livro “Ditadura Encurralada”, do Elio Gaspari, enquanto que o Nixon ia visitar em 1972 a Cidade Proibida da China, o Brasil estava em 1975 discutindo se o país podia abrir conversa com os chineses para acordos comerciais. Isso só demonstrava de fato o atraso do Brasil na transição das décadas 70 e 80 para o início da abertura de comércio global.

E se até os anos 80 ficar somente longe de confusão dava frutos, a partir dos anos 90 a globalização poderia gerar tanto ganhos quanto perdas [mas perdas menores do que simplesmente se isolar] ao aderir essa aldeia global. Apesar disso, conflitos isolados - como a guerra Irã versus Iraque – não levavam mais o mundo para o desastre, ao passo que crise vinda de parceiro comercial era considerada um caos. Conflito no oriente médio não afetava o Brasil. Mas crise na Argentina, Rússia e México, parceiros comerciais na época, geravam caos econômico no país.

Deste modo, o mundo ficou tão globalizado no fim dos anos 90 que a economia internacional conseguiu contaminar o mercado do mundo todo com crises sistêmicas. E o início do século XXI está recheado de exemplos. Com a temporização de ciclos econômicos, em 2001 a bolha ponto com incomodou o mercado com uma crise que gerou desempregos e falências no ramo de comunicações em boa parte do mundo [foi nessa época que criaram a ideia de jerico chamado “downsizing”]. Em 2008, a bolha imobiliária atingiu em cheio os EUA e a Europa, puxando o mundo junto neste caos [em 2009, o PIB brasileiro foi negativo]. E agora, em 2020, com esse surto de pandemia de Coronavírus, há quem diga que essa paralisação mundial está a gerar a maior crise econômica da humanidade. Porque a pandemia se espalhou no mundo todo; ao passo que a economia global está totalmente interligada e engessada, não podendo se reativar, sendo que esse modelo capitalista depende do aceleracionismo global para prosperar.

Portanto, diante das argumentações evidentes, se houver uma nova guerra fria a eclodir, pelas forças geopolíticas descentralizadas fora do eixo EUA versus China, com potências do Oriente Médio e Europa existindo de fato, situação em que no ano de 1964 não existia, o melhor a se fazer é abandonar esse saudosismo de passado que não existiu – além, é claro, de não fazer alinhamento automático com nenhuma nação desta nova polarização internacional. Até porque o “grande país Brasil” do intervalo de décadas de 1930 até 1980 fazia parte de um mundo desconectado, com tiranetes que promoviam keynesianismo inflacionário e com isso entregavam somente “voo de galinha” como resultado econômico “positivo”. Método econômico este que não funciona, mesmo em pandemia de Coronavírus, em um mundo globalizado como o dos dias atuais.

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O Brasil Tem que fazer um estímulo econômico após a pandemia sim, mas não caiam nesse papinho maroto de Nacional desenvolvimentismo de Ciro Gomes e do Paulo Gala, diante um apoio de um keynesianismo inflacionário, porque isso não funciona de fato, é apenas uma econometria embusteira.









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