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O CMV da Elite Global e o Brasil como Desova do Mundo


Por: Júlio César Anjos

“Quando uma ideologia fica bem velhinha, vem morar no Brasil.” - Millôr Fernandes

A célebre frase de Millôr Fernandes: “Quando uma ideologia fica bem velhinha, vem morar no Brasil” é interpretada para a maioria dos brasileiros como sendo algo direcionado mais especificamente – e somente - à política. Engano. Esta frase é global e pode ter embasamento tanto de natureza econômica quanto até mesmo social porque se traduz como ideia. Na verdade, Millôr foi polidamente eufemístico, pois, na verdade, o Brasil é a desova do mundo. E uma das principais desovas se dá no campo econômico, feita pela CMV [custo da mercadoria vendida] da elite global.

Antes de tudo, deve-se saber o que é CMV [custo de mercadoria vendida]. Na contabilidade, CMV, segundo Gabriela Ventura (do site: Mandae): “o custo de mercadoria vendida parte da premissa de que o sucesso de determinado produto não é medido pela quantidade de saídas do estoque, mas sim pela quantidade de itens que sobraram, uma vez que a armazenagem pode representar prejuízo para a empresa”.

Você, leitor que não entende nada de contabilidade, tem que compreender pelo menos o básico: se a empresa parar de vender qualquer produto que seja, a partir deste momento o estoque e toda a sua cadeia de produção vira problema. Vira custo daquilo que se vende. Por isso a sigla CMV.

Já sabendo dos termos técnicos, como que uma empresa pode deixar de vender um produto, mesmo estando, por ora, em funcionalidade o mercado de atuação? Simples: mudança de tecnologia, barreiras legislativas, e até de caráter de estilo de vida. Ou seja, mudança de padrão.

Como se sabe, desde produto têxtil até entretenimento de games, a elite global foca o lançamento primeiramente nos países desenvolvidos e, após longo período de incubação, este produto é baldeado para os países menos desenvolvidos este fluxo de comercialização. Até aí tudo bem porque é um simples atraso de lançamento de produto. O problema é quando o produto repentinamente cai em desuso. Aí gera CMV e tal produto tem que ser desovado em algum lugar. E qual é o lugar do planeta em que uma ideia velhinha consegue prosperar? É o Brasil.

Deste modo, há 5 itens que estão caindo em desuso nos países desenvolvidos e que a elite global quer empurrar esse estoque [CMV] para o Brasil – e até manter a cadeia de produção em operação, mesmo sendo itens decadentes. Os 5 itens são: 1) Armas; 2) Drogas Legais; 3) Agrotóxicos; 4) Internet “G”; 5) Liberalismo.

Armas

Caso o leitor não tenha saído recentemente do coma, é sabido que os EUA estão a bater em retirada dessas guerras paramilitares no mapa geopolítico. Agora, os ataques e a vigilância oriunda nos territórios inimigos são feitos por drones de guerra.

Portanto, a guerrilha paramilitar física lutada com soldados humanos está a diminuir.  E com isso, diminui-se também a quantidade de armas de uso militar.

Se os países desenvolvidos estão diminuindo a demanda de armas de combates, e substituindo por drones, sendo que tais artefatos são caros para mantê-los em estoque, o fato é que a elite global tem que achar alguém para vender a sucata que está a gerar despesa sem parar para o país detentor deste material bélico. Ou seja, se livrar do CMV contábil.

E qual é o país atrasado que elegeu um presidente fazendo arminha com a mão? Sim, o Brasil.

O Brasil deve focar em drone, até mesmo para fazer vigilância de fronteira e da Amazônia – tanto a florestal quanto a azul. Mas parece que o Brasil quer fazer controle do território com fuzil. Questão de lobby da bancada da bala.

Assim como a machadinha foi aposentada depois que apareceu a pólvora, o fato é que deveria “aposentar” [ou usar menos possível] o fuzil para focar no drone. Mas o Brasil é o país em que a ideia velhinha vem morar.

O Brasil será o destino da sucatinha de arma mundial.

Enfim, ideia nova: drone; ideia velha, fuzil.

Drogas Legais

Os países desenvolvidos estão fechando, pela legislação, o consumo desenfreado de drogas que tentam medicar depressão, ansiedade e estresse. Além destas, ainda há a “droga da inteligência” que também está a ser combatida porque, na verdade, o que a indústria farmacêutica está fazendo é gerar milhões de drogados nos países ricos.

Então estes países mais ricos estão banindo o consumo desenfreado destas drogas legais.

Novamente, pensando sobre estoque e cadeia de produção, onde é que a elite global quer despejar os seus produtos banidos em outros locais? Sim, Brasil.

Deste modo, pelo lobby, tanto a bancada da bula quanto as empresas de comunicação, especialmente as tevês, irão começar a se preocupar com o sujeito que está depressivo, com o que está estressado e com o que está ansioso porque as pessoas estão sofrendo com problemas mentais, embora tudo isso tenha tratamento.  

Com este show de preocupação vindo da tevê, é óbvio que as indústrias farmacêuticas vão continuar a produzir produtos banidos nos países desenvolvidos, que foram proibidos por causa das discussões sociais que demonstraram a nocividade de tais produtos para os usuários, para atender o público terceiro-mundista brasileiro.

Ideia nova: Proibir pela legislação drogas legais que estão fazendo mal para as pessoas dos países ricos; ideia velha: comprar estes medicamentos banidos em outros países.

Agrotóxicos

Enquanto que os países desenvolvidos já estão se mexendo para implantar as fazendas verticais, locais de plantações de alimentos que geram eficiência territorial e maior segurança contra pestes em geral, o Brasil escancarou a liberação de uso de agrotóxicos de maneira anárquica e total.

Embora o argumento do governo seja válido, que diz que tais agrotóxicos já existem e são comercializados no mundo todo, vale ressaltar que o problema do Brasil está no controle e na fiscalização do uso do agrotóxico.

O Brasil já vendeu até carne podre para o mundo árabe, como denunciou a operação carne fraca.

E se for analisar que o que diferencia o remédio do veneno é a dose, é fato que se o Brasil liberar geral os agrotóxicos, mesmo não sabendo fazer controle e fiscalização, isso tenderá a dar problema de doença não só no Brasil, mas no mundo todo, por causa do descontrole de uso de agrotóxicos embutido na agricultura que irá até para exportação.

Se mesmo com proibição de alguns agrotóxicos há burla no meio agro; com liberação geral destes agrotóxicos é que o negócio sairá do controle e o defensivo, que deveria ser “remédio”, poderá ser com certeza veneno no Brasil.

O problema não é a empresa que fabrica e vende agrotóxicos; o problema infelizmente é o brasileiro “Lei de Gérson”.

Portanto, a ideia novinha é a fazenda vertical. E a ideia velhinha que vem morar no Brasil é o “libera geral” de agrotóxicos para um país que não consegue controlar nem fiscalizar o uso de tais defensivos agrícolas.

Internet G

Há 10 anos [2009] o mundo civilizado discutia a internet 4G. Enquanto isso, no Brasil, o sistema 3G não funcionava direito. Em 2014, o mundo civilizado discutia a implantação do 5G. No Brasil, o 3G não funcionava direito.

Agora, em 2019, enquanto que em algumas regiões afastadas do país o 3G funciona pessimamente, enquanto que o 4.5G funciona bem só em área metropolitana e somente em zona burguesa, o mundo já está operando em 5G.

  Estima-se que em 2024 60% da população mundial tenha 5G disponível no telemóvel. E o Brasil, agora em 2019, está começando a discutir se o 5G dá câncer [algo que já foi superado em outros países e não passa de teoria da conspiração].

Então a ideia nova implantada nos países desenvolvidos é que o 5G já é realidade. E no Brasil, a ideia bem velinha de que a tecnologia 5G dá câncer [algo já superado há 3 ou 4 anos no mundo] está em alta no Brasil.

Mas não se apavore leitor, em 2029 o Brasil começará a implantar o 5G, enquanto o mundo já estará implantado outra tecnologia melhor para o mundo civilizado. Daqui a 10 anos o 5G chegará timidamente no Brasil. Tenha fé.

Enquanto o 5G não chega, divirta-se com as discussões que dizem que o 5G dá câncer, que o 5G estraga aparelhos, que o 5G é uma tecnologia para dominar o homem e etc. Você gosta de ideia bem velhinha; você é brasileiro.

Liberalismo

Antes de tudo, uma pergunta: O mundo está passando por uma fase EstaDista [não confunda com EstaTista] ou Liberal?

É lógico que você, doutrinado por essa loucura bolsonarista, vai dizer que o mundo passa por um surto liberal. O fato é que é exatamente o contrário, o mundo passa por fechamento de fronteira e de primazia do interesse do Estado perante o mercado global.

Basta analisar o Trump. Trump é uma espécie de caixeiro-viajante que vende interesses norte-americanos. Por isso o slogan: “make america great again”.

Um exemplo disso se dá no lobby vindo diretamente do Trump, ao pedir recentemente que o Bolsonaro faça uma medida provisória mudando a lei de TV paga do Brasil, porque a AT&T comprou a Warner e não se pode, na lei vigente brasileira, ter verticalização do setor de comunicação.

Agora, veja que engraçado: é justamente o impedimento da verticalização no setor de telecomunicação que faz haver um mínimo de concorrência entre produtor e quem transmite um entretenimento de vídeo qualquer na comunicação.

Com a possibilidade de verticalização do setor, o que haverá é oligopólio de conglomerados donos de cadeias de comunicações inteiras. Justamente o que um liberal não quer. Mas é justamente o que os EUA, que lideram esse tipo de mercado, querem fazer.

Então, Trump, um estadista que trabalha pelos interesses do seu país, é o exemplo de que o mundo hoje vive uma era estadista e não liberal como se imagina.

Como no Brasil a ideia velhinha vem morar no país, então o brasileiro votou pela ideologia que se sustenta pelo liberalismo, sendo que liberalismo está em falta no mundo.

Se o mundo está estadista, mas alguns países da América do Sul são liberais, então é fato, sem contestação, que o Brasil está sim, infelizmente, sendo ENTREGUISTA porque escancara as portas do país sem ter contrapartida alguma de negociação.

Outro exemplo se dá no setor de transporte internacional: O Brasil é o país que tem a maior extensão territorial banhada pelo mesmo oceano [Atlântico], e mesmo assim não há uma companhia de transporte marítimo que seja de bandeira brasileira operando no mundo. Enquanto isso, mesmo o brasileiro sendo o inventor do avião com Santos Dumont, o Brasil hoje entrega a Embraer para os norte-americanos “de mão beijada”, sem contrapartida.

Aí é difícil.

Ou seja, a ideia novinha: estadismo; ideia velhinha que vem morar no Brasil: liberalismo [entreguismo].


Portanto, Millôr Fernandes estava certo ao criar a frase: “Quando uma ideologia fica bem velhinha, vem morar no Brasil”, pois, o mundo está passando por transformações e o Brasil continua a ser o lugar de desova de produtos e conceitos arcaicos no mundo. O CMV [custo da mercadoria vendida] da elite global quer empurrar ao brasileiro: armas antiquadas, sendo que o mundo demanda agora drones; drogas legais que, pelas legislações dos países desenvolvidos, são proibidos de serem comercializados porque fazem mal a toda a sociedade; Agrotóxicos, sendo que o mundo caminha para as fazendas verticais; internet 4G ou obsoleta, sendo que o mundo está mudando para o 5G; e tudo isso embasado e sustentado pela ideologia que distorce todas essas discussões: o liberalismo [que está mais para o entreguismo], sendo que o mundo está indo para o caminho do estadismo.

Millôr Fernandes é um fidalgo, fez eufemismo ao afirmar a sua frase que condiciona o Brasil ao atraso. Na verdade, o Brasil é o entulho do mundo.







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