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Articulação Política e o Raciocínio Bolsonaro

Por: Júlio César Anjos

Articulação. A melhor explicação para essa palavra vem da junção de duas partes para fazer um movimento de uma ação. Sejam ossos, eixos, ou pistões, o fato é que o sistema se sujeita como um mecanismo para fazer locomoção. Na política, diz-se enganosamente que articulação é sinônima de barganha, negociação, “toma lá, dá cá”, interesses mútuos e etc. O que se traduz, erroneamente, como sendo corrupção. Mas a verdade é que, seja para um objeto mecânico ou uma ação politica, articulação é a sinergia de dois ou mais objetos criando uma movimentação de uma ação.

Quando a articulação é positiva, há aquilo que é chamado de harmonia, sintonia, trabalho mútuo, a boa fruição. O mecanismo opera tranquilamente, sem solavancos nem percalços, o que faz a ação gerar boas energias. Isso serve também tanto para um carro quanto para os poderes do Estado. E quando a articulação é negativa, há aquilo que é chamado de desarmonia, desagregação, destruição. O mecanismo opera em exaustão porque alguma coisa está em desacordo, com fadiga e stress no sistema, o que faz gerar energias negativas. E isso também serve tanto para maquinário industrial quanto para as instituições do poder político.

Mas há uma diferença radical entre objetos mecânicos e indivíduos políticos no que se trata de articulação. Pessoas podem escolher se querem operar em uma sinergia positiva ou numa entropia negativa. Podem escolher entre a união para que o trabalho seja de ganha-ganha; ou podem agir de forma viciada, em que o que se mantem é a crispação do perde-perde. Na crispação todos perdem. E na união ganha o Brasil.

Dito isto, os poderes realmente são divididos, embora tenham que ser também harmoniosos. Ou seja, essa divisão significa fração e não uma fissura do todo em questão. A fração somada volta ao seu inteiro; já a fissura não, pois há perdas. Então os poderes constituídos são frações do poder e não órgãos fissurados discordantes que se digladiam para a obtenção do poder pelo todo – o que não existe no regime democrático.

Todavia, dos três poderes cabe o executivo por ter concentração do poder em uma figura só – o presidente - fazer costuras políticas ao gerar harmonia, o bom funcionamento do sistema, ao que isso se dá o nome de articulação política. Até porque a lógica é matemática: o judiciário é dividido em 11 ministros, além das instituições; e o congresso é fracionado em 513 parlamentares.

Um bom presidente chama todos para conversar, tomar aquele cafezinho, e os problemas entram gigantes e saem pequenos no palácio do planalto. Um presidente ruim só gera entrevero, só desagrega e, por causa das próprias ações, consegue até mesmo gerar crise nacional, pois, os problemas entram pequenos e saem gigantes nas tomadas de decisão do executivo nacional.

A ferramenta chamada articulação, no Brasil - por causa de populismo barato -, está sendo interpretada pelo povo de forma errada, fazendo com que a política seja considerada por si só uma modalidade de crime. E quando algo que é habitual é considerado como criminoso, aí é que não se dá para fazer política mesmo.  

O que popularizou na camada social brasileira é que a articulação política seja sinônima – o que não é – de compra pecuniária de parlamentares, como no caso de mensalão e petrolão.

Mas o PT fez mensalão e petrolão justamente porque faziam crispação política, por via ideológica, ao que teriam, por motivos óbvios, ingovernabilidade. Então, o PT, para manter tanto a governabilidade quanto o avanço ideológico de forma radical, comprou tudo e a todos pela corrupção. Essa operação que gerou trauma no Brasil em geral está a fazer agora que o povo entenda, erroneamente, que articulação política seja compatível com mensalão e petrolão.

Diante disso, Bolsonaro subiu ao poder justamente com essa forma de pensar: articulação = corrupção. É complicado esse tipo de raciocínio porque as ações do executivo geram reações em toda a sociedade, tanto econômica quanto social. Ou seja, Bolsonaro está para criar crise, pois não sabe lidar com a harmonia dos poderes. E não sabe lidar com os poderes porque não sabe - ou ideologicamente não pode - fazer articulação.

Todavia, há sim momentos da história em que o executivo precisa fazer aquele esforço a mais para conseguir obter aprovação de emenda impopular, que precisa de 2/3 do congresso. Nesses casos de exceção, o executivo deve ter empatia e compreender que o parlamentar só fará algo que seja impopular, ao apoiar o executivo, como uma reforma da previdência, por exemplo, se tiver alguma contrapartida real para conseguir estancar a sangria deste objeto que pode gerar rejeição deste parlamentar no dia da próxima eleição. Ou seja, se o político adere a reforma da previdência sem ter alguma coisa para mostrar ao seu eleitorado [alguma emenda ou obra de infraestrutura para a sua região], este político seria escorraçado do seu curral eleitoral pela simples alegação: “o parlamentar além de tirar direito ainda não fez nada pelo povo.” O que seria uma verdade para o populismo.

Os parlamentares sabendo disso - e como todos os deputados querem se manter no poder, e para isso precisam passar pelo crivo eleitoral - não vão embarcar em uma odisseia impopular só por causa dos olhos azuis do Bolsonaro ou por causa da grande erudição de Guedes. É por isso que nessas horas, nestes momentos de exceção, é compreensível que o executivo faça esforço a mais para que o deputado dilua a impopularidade no seu curral eleitoral, pois, se este político em questão votou em tirar o direito do povo, ao menos trouxe algo para o seu distrito eleitoral, fazendo o deputado conseguir voltar ao congresso na próxima eleição por ter alguma coisa a mostrar.

A outra forma é via loteamento de cargos de ministérios e etc., aos seus apoiadores, para ganhar apoio com esse meio de troca. Mas isso também é considerado corrupção para os bolsonaristas. Essa miopia e interpretação errada da realidade causará mais cisão porque vai contra a tal da “nova política”, que é a de não dar cargos em troca de votos.

Liberar uma emenda, um recurso de fundo perdido ou introduzir um projeto no orçamento para execução, ao contrário do que se imagina, não é “toma lá, dá cá” nem é corrupção. É, na verdade, a grande e talentosa arte da articulação política. Até porque isso é uma regra do jogo, já que os recursos são concentrados no executivo nacional. É questão de coalizão.

 Ao criar essa crise por cisão, essa crispação recairá, no longo prazo, mais na impopularidade do executivo do que do legislativo, já que a responsabilidade é "ovos com bacon". Neste caso, o executivo está comprometido no processo tal qual como o porco [bacon]; e o legislativo somente está envolvido tal qual como a galinha [ovo]. Ou seja, Bolsonaro querer fazer cisão ao invés de união, e sem fazer mensalão e/ou petrolão como fez o Lula-PT, tal condição só fará o governo desgastar por engessamento. Portanto, Bolsonaro, o breve.

E, além de tudo isso, há também de suspeitar a tal da “nova política”, e suas reais intenções, que o governo quer programar pelo populismo. Ao fazer esta narrativa, a direita quer convencer a todos que a palavra: “novo” signifique automaticamente "bom". O que é uma falácia, pois, comunismo, fascismo, nazismo, Hugo Chávez, Pinochet, Fujimori, Mao Tsé-Tung e etc., foram considerados nos seus momentos históricos como sendo o “novo” que estaria por vir, já que era uma ruptura contra o sistema vigente. Novo, na verdade, significa diferente ou desconhecido. E um diferente e desconhecido que pode significar algo ruim.

Nova política sem articulação? Só resta aguardar os resultados.

Portanto, articulação significa a movimentação de uma ação. Como, por exemplo, os ossos do corpo, uma ótima articulação pode gerar a capacidade de fazer exercícios físicos de alto rendimento, mas uma articulação ruim pode gerar doença degenerativa de artrite. Na mecânica, uma boa articulação gera alto rendimento em uma máquina, sendo que uma má articulação pode gerar exaustão do sistema. E na política, uma boa articulação pode gerar uma união ganha-ganha, mas uma má articulação pode gerar perturbação que só realizará crise. Os poderes, embora divididos, devem ser harmônicos. Neste sentido, quem critica a articulação é aquele agente extremista que surgiu nessa  dita "nova política". O problema é que “novo” não é sinônimo de bom, assim como todos os regimes totalitários e fracassados convenceram os povos de ser “o novo” e, com isso, no fim tramaram contra a própria população. Essa crispação, fazendo da política somente base de cisão, fará com que, inexoravelmente, o executivo definhe por engessamento, até acontecer a sua extinção. Ou talez queiram ser salvos ao fazer a ruptura do novo: uma ditadura vindo aí.




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