Por:
Júlio César Anjos
Um
texto abordado pela perspectiva utilitarista.
***
Para
os utilitaristas, o aborto é um assunto complexo, sensível e espinhoso, pois,
para tal corrente filosófica, há de saber quando o embrião vira vida. Porque, a
partir do momento que começa a vida, este outro ser ganha defesa social de
Princípio do Dano, da busca pelo prazer e fuga da dor, e da comiseração. E há
também a responsabilização consequencialista em tirar a vida de um indefeso,
por causa dessa dúvida em saber quando há vida e quando não há. O
espermatozoide é considerado vida ou é vida só aos nove meses de gestação?
Complicado. Não tem como saber. Então, pela percepção utilitarista, o tema
aborto requer debate.
Mas
há um grupo mais interessado ainda que os utilitaristas na questão de aborto
que são os religiosos. Desde argumento como direito à propriedade privada da
vida concebida até o tal “assassinato de bebês”, os religiosos, diariamente,
convencem a população que realmente a vida concretizada pela concepção custa
muito caro, de valor inestimável moralmente falando, para a segmentação religiosa.
Os
religiosos, pelo convencimento emocional, impedem o país até mesmo de discutir
sobre o tema aborto. Então, na teoria, nenhum brasileiro conseguiria abortar.
Certo? Errado. Como no mundo há um sem-número de países que já fazem aborto, o
rico faz turismo médico e aborta em outro país se quiser abortar. Já a classe
média ainda tem a chance de fazer desembolso para fazer aborto em um país
sul-americano ou ter a criança, pois ainda dá condições para ter um lar
saudável para fazer este bebê desenvolver-se como um ser humano normal, com
todas as garantias sociais. E o pobre?
Este não tem condições para fazer turismo médico para abortar [não tem nem
passaporte] e também não tem condições de criar o filho, que talvez seja até
uma gravidez indesejada que a mãe terá que conceber porque não há como abortar.
Sendo
assim, alguém dirá: “pobre não tem que fazer filho”; ou: “tem camisinha e
pílula para não precisar abortar”. Só que o problema recai em dois fatores: o
pobre instruído x o pobre não instruído. O não instruído é aquele que não tem
educação por causa da desigualdade social, ele não tem educação social e faz
filho por causa descuido de falta de informação. E o pobre instruído quer fazer
filho porque o programa bolsa-família ao menos garante uma renda para sobrevida
de bolsa-família, para ele e para os filhos [o pobre se salvando pelo programa
social. Lembra-se do Bolsonaro falando: “essa criança aqui é uma geladeira?”
Então, é sobre isso que de deve discutir]. Há uma contradição que gera conflito
gigante aí. Se a pessoa é contra o aborto, nestas condições, deverá ser a favor
do programa bolsa-família – por questões religiosas e também humanitárias.
Deste
modo, havendo discrepância, como o Estado impede o aborto no mesmo momento que
dá condições do programa bolsa-família, o cidadão tem que tomar cuidado com o
chamado: ventre estatal – o ventre não é da mulher, o ventre é do Estado.
O ventre estatal pode ser visto como exemplo
na China. Na China, em uma época não muito distante, o governo chinês
controlava os ventres, seja para aumentar população, diminuir a demografia, ter
só filhos homens ou somente filhas mulheres, com punição severa caso os
viventes não acatassem as regras gerais. É a engenharia social para tentar
planificar a pirâmide etária. Controle social em cima da mulher, diga-se. E se
for observar que no Brasil há a proibição do aborto e a liberação de recurso
para o programa bolsa-família, dá pra dizer sim que no Brasil há o controle do
ventre estatal. O ventre não é propriedade privada da mulher porque é impedida
de escolha de abortar e o Estado ainda a incentiva a conceber.
Já
que há várias contradições, então qual é a solução? A solução é tributar
grandes fortunas de igrejas para pagar bolsa-família. Ou seja, a vinculação dos tributos recolhidos de igreja rica para servir aos pobres ao salvarem as suas proles e seu desenvolvimento saudável.
Ora,
se o religioso defende a vida, ao impedir o aborto, ao ponto de apelar na
argumentação pela emoção de que se está “assassinando bebês”, sendo que algumas
instituições religiosas possuem lucro de multinacionais, é óbvio que a igreja
deve pagar monetariamente pelo o que custa muito caro pelo seu valor moral.
Além disso, tira do Estado o controle de ventre estatal.
Mas
a constituição impede que igreja seja tributada porque isso poderia impedir a
liberdade de professar fé. Mas a constituição não atentou para o desarranjo de
que algumas instituições religiosas possuem lucros acima até que de
multinacionais! Até porque uma empresa tem custo de entrada [matéria-prima], de
produção e de saída, além da expectativa de venda [custos elevados para
obtenção de lucro]. Às vezes o faturamento é alto, mas o lucro é baixo em uma
empresa. E a igreja? Muitas igrejas no Brasil possuem só entradas, que são os
dízimos e as ofertas [e às vezes praticam até lavagem de dinheiro], não tendo
muitas saídas, não há tantos custos embutidos no produto chamado fé. Se o
leitor acha que isso é blefe, basta encontrar o quanto que a igreja católica
aqui no Brasil faz de remessa ao exterior para o Vaticano. Sem falar em pastor
que tem heliporto para baldear grandes cifras de dinheiro por via aérea. Tudo
isso já é sabido pelo público em geral. Chega ser até uma aberração.
Propõe-se,
então, como solução que igrejas que possuem grandes fortunas paguem o programa
bolsa-família. Até porque quem é pró-vida tem que cuidar do feto até ele
crescer, não é mesmo? As igrejas que possuem grandes fortunas iriam contra esta
solução, ao não quererem ser taxadas por causa de defesa constitucional? Aí
basta jogar holofote em cima e debater pra ver. Os religiosos gostam de
dinheiro, são inteligentes e com certeza não pagariam pra ver. Bem
conversadinho, as igrejas bilionárias não se incomodariam em pagar o programa
bolsa-família como contribuição para a sociedade, para que se evite fazer
assassinato de bebês.
Essa seria a relação ganha-ganha perfeita. As
igrejas que possuem grandes fortunas contribuem de bom grado à sociedade ao
pagar todo o custo do programa bolsa-família; os pobres, que é o grupo social
mais prejudicado em não poder fazer aborto, não precisão se preocupar com o
futuro, pois serão assistidos pelo programa bolsa-família; e o Estado tira mais
um peso das costas, ao não precisa desembolsar imposto para pagar este programa
social. Qualidade de vida e bem-estar social vindo pelo coletivo organizado.
Perfeito.
Agora,
há outra solução: as igrejas que possuem grandes fortunas continuam com totais
isenções; mas terão que aceitar o aborto como escolha da mulher pobre. O que
não dá pra aceitar é ver esse desarranjo social. É tão sem lógica que não passa
de absurdo tal condição atual.
Portanto,
pela visão utilitarista de qualidade de vida e bem-estar social, o aborto é um
tema sensível porque não se sabe quando o feto é vida. Há de trazer fator
científico sobre o assunto. A proibição do aborto é factível desde que tal
decisão não comprometa todo o arranjo social. Mulheres pobres não possuem nem
passaporte pra fazer turismo médico, a abortar em outros países, além de não
conseguirem sustentarem-se no dia-a-dia – o que acarreta que não conseguirão
manter a segurança do bebê até o seu desenvolvimento, gerando mazelas sociais.
Com problema de falta de educação e outras condições de desigualdades sociais,
o pobre acaba tendo filho ou porque não tem instrução ou porque quer ganhar o
programa bolsa-família [para se salvar e conseguir se sustentar]. E pela
conjuntura, não dá também para proibir o aborto e tirar o programa social.
Neste ponto, quem mais é interessado à proibição do aborto é a igreja. Como
sabido, há igrejas que possuem grandes fortunas. E, pela lógica, seria natural
que as igrejas que possuem grandes fortunas paguem pelo programa bolsa-família
para o pobre, que em muitos casos nem tem o que comer. Com esse padrão, o
Estado tira um fardo das costas. E todos ficam felizes. Agora, se a igreja que
tem grande fortuna não quer pagar imposto, que aceite então a taxação; ou então
aceitem a solução de isentar as mulheres para poderem abortar.
Do
jeito que está configurada a situação, não deixar a mulher pobre abortar, e
querendo tirar até o programa bolsa-família como programa de salvação, o aborto
proibido chama-se tortura, pelo ponto de vista social dos dias atuais.
***
Obs:
não dá também para ser pró-vida, defensor de bebês no ventre, mas, que a o mesmo tempo, seja
contra o programa bolsa-família, dizendo que há mulheres que usam deste
programa pra comprar geladeira, tevê e etc. [como o Bolsonaro fez entender]. É uma aberração de tão incoerente é essa linha de raciocínio.

A Discussão sobre o Aborto de Júlio César Anjos está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
Baseado no trabalho disponível em https://efeitoorloff.blogspot.com.
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