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A Discussão sobre o Aborto

Por: Júlio César Anjos

Um texto abordado pela perspectiva utilitarista.

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Para os utilitaristas, o aborto é um assunto complexo, sensível e espinhoso, pois, para tal corrente filosófica, há de saber quando o embrião vira vida. Porque, a partir do momento que começa a vida, este outro ser ganha defesa social de Princípio do Dano, da busca pelo prazer e fuga da dor, e da comiseração. E há também a responsabilização consequencialista em tirar a vida de um indefeso, por causa dessa dúvida em saber quando há vida e quando não há. O espermatozoide é considerado vida ou é vida só aos nove meses de gestação? Complicado. Não tem como saber. Então, pela percepção utilitarista, o tema aborto requer debate.

Mas há um grupo mais interessado ainda que os utilitaristas na questão de aborto que são os religiosos. Desde argumento como direito à propriedade privada da vida concebida até o tal “assassinato de bebês”, os religiosos, diariamente, convencem a população que realmente a vida concretizada pela concepção custa muito caro, de valor inestimável moralmente falando, para a segmentação religiosa. 

Os religiosos, pelo convencimento emocional, impedem o país até mesmo de discutir sobre o tema aborto. Então, na teoria, nenhum brasileiro conseguiria abortar. Certo? Errado. Como no mundo há um sem-número de países que já fazem aborto, o rico faz turismo médico e aborta em outro país se quiser abortar. Já a classe média ainda tem a chance de fazer desembolso para fazer aborto em um país sul-americano ou ter a criança, pois ainda dá condições para ter um lar saudável para fazer este bebê desenvolver-se como um ser humano normal, com todas as garantias sociais.  E o pobre? Este não tem condições para fazer turismo médico para abortar [não tem nem passaporte] e também não tem condições de criar o filho, que talvez seja até uma gravidez indesejada que a mãe terá que conceber porque não há como abortar.

Sendo assim, alguém dirá: “pobre não tem que fazer filho”; ou: “tem camisinha e pílula para não precisar abortar”. Só que o problema recai em dois fatores: o pobre instruído x o pobre não instruído. O não instruído é aquele que não tem educação por causa da desigualdade social, ele não tem educação social e faz filho por causa descuido de falta de informação. E o pobre instruído quer fazer filho porque o programa bolsa-família ao menos garante uma renda para sobrevida de bolsa-família, para ele e para os filhos [o pobre se salvando pelo programa social. Lembra-se do Bolsonaro falando: “essa criança aqui é uma geladeira?” Então, é sobre isso que de deve discutir]. Há uma contradição que gera conflito gigante aí. Se a pessoa é contra o aborto, nestas condições, deverá ser a favor do programa bolsa-família – por questões religiosas e também humanitárias.

Deste modo, havendo discrepância, como o Estado impede o aborto no mesmo momento que dá condições do programa bolsa-família, o cidadão tem que tomar cuidado com o chamado: ventre estatal – o ventre não é da mulher, o ventre é do Estado.

 O ventre estatal pode ser visto como exemplo na China. Na China, em uma época não muito distante, o governo chinês controlava os ventres, seja para aumentar população, diminuir a demografia, ter só filhos homens ou somente filhas mulheres, com punição severa caso os viventes não acatassem as regras gerais. É a engenharia social para tentar planificar a pirâmide etária. Controle social em cima da mulher, diga-se. E se for observar que no Brasil há a proibição do aborto e a liberação de recurso para o programa bolsa-família, dá pra dizer sim que no Brasil há o controle do ventre estatal. O ventre não é propriedade privada da mulher porque é impedida de escolha de abortar e o Estado ainda a incentiva a conceber.

Já que há várias contradições, então qual é a solução? A solução é tributar grandes fortunas de igrejas para pagar bolsa-família. Ou seja, a vinculação dos tributos recolhidos de igreja rica para servir aos pobres ao salvarem as suas proles e seu desenvolvimento saudável.  

Ora, se o religioso defende a vida, ao impedir o aborto, ao ponto de apelar na argumentação pela emoção de que se está “assassinando bebês”, sendo que algumas instituições religiosas possuem lucro de multinacionais, é óbvio que a igreja deve pagar monetariamente pelo o que custa muito caro pelo seu valor moral. Além disso, tira do Estado o controle de ventre estatal.

Mas a constituição impede que igreja seja tributada porque isso poderia impedir a liberdade de professar fé. Mas a constituição não atentou para o desarranjo de que algumas instituições religiosas possuem lucros acima até que de multinacionais! Até porque uma empresa tem custo de entrada [matéria-prima], de produção e de saída, além da expectativa de venda [custos elevados para obtenção de lucro]. Às vezes o faturamento é alto, mas o lucro é baixo em uma empresa. E a igreja? Muitas igrejas no Brasil possuem só entradas, que são os dízimos e as ofertas [e às vezes praticam até lavagem de dinheiro], não tendo muitas saídas, não há tantos custos embutidos no produto chamado fé. Se o leitor acha que isso é blefe, basta encontrar o quanto que a igreja católica aqui no Brasil faz de remessa ao exterior para o Vaticano. Sem falar em pastor que tem heliporto para baldear grandes cifras de dinheiro por via aérea. Tudo isso já é sabido pelo público em geral. Chega ser até uma aberração.

Propõe-se, então, como solução que igrejas que possuem grandes fortunas paguem o programa bolsa-família. Até porque quem é pró-vida tem que cuidar do feto até ele crescer, não é mesmo? As igrejas que possuem grandes fortunas iriam contra esta solução, ao não quererem ser taxadas por causa de defesa constitucional? Aí basta jogar holofote em cima e debater pra ver. Os religiosos gostam de dinheiro, são inteligentes e com certeza não pagariam pra ver. Bem conversadinho, as igrejas bilionárias não se incomodariam em pagar o programa bolsa-família como contribuição para a sociedade, para que se evite fazer assassinato de bebês.

  Essa seria a relação ganha-ganha perfeita. As igrejas que possuem grandes fortunas contribuem de bom grado à sociedade ao pagar todo o custo do programa bolsa-família; os pobres, que é o grupo social mais prejudicado em não poder fazer aborto, não precisão se preocupar com o futuro, pois serão assistidos pelo programa bolsa-família; e o Estado tira mais um peso das costas, ao não precisa desembolsar imposto para pagar este programa social. Qualidade de vida e bem-estar social vindo pelo coletivo organizado. Perfeito.

Agora, há outra solução: as igrejas que possuem grandes fortunas continuam com totais isenções; mas terão que aceitar o aborto como escolha da mulher pobre. O que não dá pra aceitar é ver esse desarranjo social. É tão sem lógica que não passa de absurdo tal condição atual.

Portanto, pela visão utilitarista de qualidade de vida e bem-estar social, o aborto é um tema sensível porque não se sabe quando o feto é vida. Há de trazer fator científico sobre o assunto. A proibição do aborto é factível desde que tal decisão não comprometa todo o arranjo social. Mulheres pobres não possuem nem passaporte pra fazer turismo médico, a abortar em outros países, além de não conseguirem sustentarem-se no dia-a-dia – o que acarreta que não conseguirão manter a segurança do bebê até o seu desenvolvimento, gerando mazelas sociais. Com problema de falta de educação e outras condições de desigualdades sociais, o pobre acaba tendo filho ou porque não tem instrução ou porque quer ganhar o programa bolsa-família [para se salvar e conseguir se sustentar]. E pela conjuntura, não dá também para proibir o aborto e tirar o programa social. Neste ponto, quem mais é interessado à proibição do aborto é a igreja. Como sabido, há igrejas que possuem grandes fortunas. E, pela lógica, seria natural que as igrejas que possuem grandes fortunas paguem pelo programa bolsa-família para o pobre, que em muitos casos nem tem o que comer. Com esse padrão, o Estado tira um fardo das costas. E todos ficam felizes. Agora, se a igreja que tem grande fortuna não quer pagar imposto, que aceite então a taxação; ou então aceitem a solução de isentar as mulheres para poderem abortar.

Do jeito que está configurada a situação, não deixar a mulher pobre abortar, e querendo tirar até o programa bolsa-família como programa de salvação, o aborto proibido chama-se tortura, pelo ponto de vista social dos dias atuais.


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Obs: não dá também para ser pró-vida, defensor de bebês no ventre, mas, que a o mesmo tempo, seja contra o programa bolsa-família, dizendo que há mulheres que usam deste programa pra comprar geladeira, tevê e etc. [como o Bolsonaro fez entender]. É uma aberração de tão incoerente é essa linha de raciocínio.





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