Por: Júlio César Anjos
As
expressões “Gemeinschaft e Gesellschaft” são um conceito desenvolvido pelo
pensador Ferdinand Tönnies que analisou a diferença cultural e moral entre a metrópole
e o meio rural. E, assim como a observação feita na época deste estudo em
questão, nos dias atuais o Brasil também possui uma cisão “capital x Interior”.
Deste modo, este trabalho elaborado pelo sociólogo alemão será base para o
entendimento e da compreensão do surgimento Bolsonaro e o porquê deste novo
elemento afetar alguns tucanos neste momento; mas que, no entanto, este ente
causará problemas maiores mesmo para os petistas no futuro, com o surgimento do
partido da extrema-direita chamado Patriotas.
Segundo
Tönnies, há uma distinção entre as comunidades rurais e a moderna sociedade
industrializada [Cabe ressaltar que esse estudo fora feito em 1887, época da
revolução industrial, mas os preceitos podem ser utilizados hoje, no conceito
campo x cidade]. As regiões rurais – Gemeinschaft – “são baseadas em laços
familiares e nos grupos sociais como a igreja. Comunidades pequenas tendem a
ter metas e crenças comuns, e a interação dentro delas se dá com base na
confiança e na cooperação”. Já as metrópoles – Gesellschaft – "são sociedades
mais impessoais e superficiais, baseados no interesse próprio em vez da ajuda
mútua". Em miúdos: o conservadorismo do rural é diferente da Capital.
Por
isso que há uma expressão no Paraná que diz: “O interior faz o governador”.
Esse pensamento é referendado na simples lógica de que no Estado do Paraná a
demografia é maior na soma das populações de pessoas que moram no interior (8
milhões de habitantes) comparado à Região Metropolitana de Curitiba (4 milhões
de habitantes). O mesmo não acontece em São Paulo, o interior não
necessariamente faz governador, em que a metade da população reside na Grande
São Paulo (21 milhões de habitantes) e a soma do interior dá praticamente a
mesma quantidade populacional da capital (23 milhões de habitantes). Já o Rio de Janeiro é o completo oposto do
Paraná, em que a extrema maioria da população se concentra na Região Metropolitana Carioca (12 milhões de habitantes), com a população do interior
do Rio composta de 1/3 do total do estado (4 milhões de habitantes). Ou seja, no Rio de Janeiro o interior não faz
de jeito nenhum o governador.
Toda
essa informação demográfica de IBGE serve para mostrar as diferenças entre os
estados brasileiros e o porquê do Paraná ser mais “conservador” [(reacionários)
de extrema-direita], São Paulo social-democrata [(utilitarista, bem-estar
social) de centro], e Rio de Janeiro mais progressista [(liberdades sociais) de
extrema-esquerda] nas decisões políticas/eleitorais. Por isso que é pueril ver um crítico de uma
região condenar o resultado da eleição que acontece em outro local, como um
eleitor conservador desprezar o voto de progressistas e etc., como, por
exemplo, um interiorano do Paraná fazer antagonismo quanto às decisões
eleitorais de um “rato de praia” do Rio de Janeiro, no estilo: “carioca não
sabe votar”. A política é feita para agregar as diversificações após
compreender as estratificações da limítrofe nacional, seja ela de cunho econômico
e/ou social.
Esse
fenômeno – capital x interior – explica, em partes, o ente chamado Lula. Lula
tem os estigmas: Origem Pobre - por isso foi retirante; Retirante – aquele que
vem do interior inóspito em busca de sobrevivência na capital; Metalúrgico –
trabalhador de classe média; “Acebolado” - conservador bonachão. Ou seja,
todas as situações que satisfazem o eleitorado do interior do Brasil, com
conexão também com a capital. Hoje, por causa do escândalo de corrupção, o Lula
só tem o proletkult do “trabalhador pobrezinho”, que não tem pra onde correr,
diante a crise provocada pelo próprio PT, como capital eleitoral. O grosso do
populacho que vive no interior migrou para o Bolsonaro.
Ou
seja, os erros do Lula conceberam o Bolsonaro; o PT pariu o Patriotas. Agora, o
interiorano, após sentir-se traído pelo Lula e o PT, voltou às raízes do
Gemeinschaft: Religião, família, e patriotismo [Aliás, alguém aí já viu o
Bolsonaro professar a fé em alguma igreja aos domingos? E quanto a família, por
que o Bolsonaro se separou três vezes? E onde estava o patriotismo do Bolsonaro
quando o PT saqueou o país?]. Enfim, mesmo que haja incoerências, Bolsonaro é o
candidato preferencial do interiorano porque é “honesto”. Então, a conclusão a se chegar é que o
interiorano trocou as bandeiras: do trabalhador, do sofrido [pobre e retirante],
e do espelhamento [o povo acebolado se vê como o Lula – “gente da gente”];
pelas bandeiras: da defesa da família, da religião cristã, e do patriotismo,
projetando tudo isso a valores de honestidade, em que essa parcela eleitoral migrou
para o Bolsonaro.
Mas
muitos preferem ignorar tal fato. Segundo pesquisas [que ninguém leva a sério],
o PSDB foi o partido que mais perdeu adeptos para o Bolsonaro. Na verdade, a
maior migração do eleitorado foi para “os votos inválidos” [que no momento
perfazem: indeciso, nulo, e abstenção], aquela que se decepcionou com a
política como um todo. Depois, uma
pequena parcela de extrema-direita que ficava nas asas tucana “saiu do armário”
ao apoiar Bolsonaro. Até aí, tudo bem. Agora, quem perdeu mesmo foi o PT. E o
problema do PT é ainda maior se verificar que o problema é de perda de bandeira
ideológica, pois, o PSDB social-democrata, ainda possui uma parcela
considerável eleitoral, enquanto que o PT daqui pra frente terá que resgatar o “povo
acebolado” que estará com Bolsonaro daqui pra frente. É o tal do “pobre de
direita” que o Stoppa tanto menciona em seus vídeos.
É
lógico que por questões emocionais o PT atacará o PSDB. Mas por lógica racional
não deveria. Se o binarismo PT-PSDB reinou por décadas, em que os tucanos eram
considerados de direita, agora, com os Patriotas, o PSDB será deslocado para a centro-esquerda.
Por isso, pergunta-se: Onde ficará o PT nesta janela de Overton? O PT será empurrado
para a extrema-esquerda. Por isso que os tucanos não estão ligando para o
surgimento Bolsonaro no espectro ideológico, mas sim naquilo que é temporário de
curto-prazo, que é a eleição quadrienal [isso muda conforme o tempo]. O
interiorano se descolou do PT e está agora no Bolsonaro. Mas essa parcela nunca
foi tucana em sua maioria. Então, não foram os tucanos que mais perderam com a
ascensão Bolsonaro, foi a esquerda que perdeu esse nicho como forma de “campesinato”.
E
é justamente por causa disso, o povo se enxergar semelhante ao seu candidato, que
o Lula é maior que o PT. E é justamente isso que faz com tenha que ter Lula e
Bolsonaro concorrendo, para que haja essa cisão interiorana, dando chance para
uma terceira via ganhar a eleição. Dividir para conquistar? Sim.
Quanto
ao Bolsonaro, no nicho social-democrata, ele não inspira nem contagia. Porque
ao mesmo tempo em que angaria popularidade interiorana [roubando eleitorado do
Lula], ele se mostra carimbado como homofóbico, fundamentalista religioso, com
estatismo exacerbado, que mostra animosidade em vigor. Portanto, as metrópoles
que são mais sociais-democratas enxergam em Jair um homem sem condição para
governar. Até porque o Bolsonaro é igual a um estudante que na sala de aula
chama todo mundo de burro e no recreio vive sozinho. Pode até estar certo no
que diz, mas a ofensa é superior ao fato. Ou seja, se todo mundo é corrupto de
antemão, mesmo alguns não sendo, só o que o “mito” conquistará na política será
o isolacionismo da exclusão. Então, na Gesellschaft, o Bolsonaro não tem como
prosperar.
Portanto,
quando se fala em conservadorismo, a pergunta a fazer é: de qual está se
falando? Pois há o conservadorismo rural – que é voltado à família (patriarcado),
religião (cristã), e patriotismo -, e também há o conservadorismo cosmopolita
de metrópole – defesa de liberdades individuais, defesa de minorias, e
liberdades econômicas. Por isso que no Paraná dá Bolsonaro, no Rio de Janeiro
dá Lula e em São Paulo dá PSDB. Enfim,
por causa da lei da física (duas forças opostas se anulam), e utilizando a
janela de Overton (no conceito de dividir para conquistar), criando o embate
interior x capital (Gemeinschaft e Gesellschaft), o melhor para a eleição de
2018 é que tanto Bolsonaro quanto Lula sejam presidenciáveis. Nestas condições,
um candidato de centro vencerá. O FHC já
entendeu.
Obs:
O FHC entendeu porque, segundo o ex-presidente tucano, quer ganhar do Lula na
urna. Bravata, ele quer a janela de Overton.
Obs2:
Tal estudo [Gemeinschaft e Gesellschaft, de Ferdinand Tönnies] pode ser encontrado na coleção “Grandes Ideias
de Todos os Tempos”, no Livro da Sociologia, nas páginas 32 e 33, com
esquematização de fácil compreensão sobre diferenças entre comunidade e
sociedade que referendam o estudo em questão.

Gemeinschaft e Gesellschaft na Política Brasileira de Júlio César Anjos está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
Baseado no trabalho disponível em http://efeitoorloff.blogspot.com.br.
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