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O Autoengano dos Órfãos

Por: Júlio César Anjos

Marina Silva possui o voto dos órfãos – eleitores que perderam a tutela do PT por abandono, em que deixaram a estrela de lado, mas não mudam o jeitinho que fez serem apoiadores da causa vermelha. Como aprenderam desde sempre que o PSDB é o “Lex Luthor” (cunhagem que veio do PT), tais eleitores espelharam-se na também órfã Marina Silva e votarão pelo autoengano, que nada mais é que tentar trapacear a convicção.

Esses eleitores órfãos sabem que o jeitinho petista de gerenciar não funciona, só gera caos e fracasso, tendo que ser modificado por não ser o ideal para o país. Porém esse povinho não se alinha de forma coesa, indo apoiar a oposição de fato, o PSDB, pois há muitas emoções que nublam o jeito de ser desses eleitores utópicos. Portanto, não são favoráveis ao PT, mas também não “flertam” com o PSDB por causa de um recalque qualquer.

Então, coloca-se a eleição no divã. Poderia trazer aqui o problema na questão do inconsciente coletivo – de Jung, ou talvez num possível libido – de Freud, ou numa questão das “três faces de Eva” – de Thigpen... Mas o fato é que o problema em questão recai na anomalia gerada pela convicção – de Festinger. A convicção gera o autoengano, é a primazia da crença pela razão, é o artifício de usar muleta para se sustentar.

Festinger observou:
“Ao ler uma reportagem em um jornal local, em 1964, Festinger viu diante de si a oportunidade de estudar uma reação a essa dissonância cognitiva. Um culto alegava ter recebido mensagens de alienígenas, advertindo sobre uma inundação que destruiria o mundo em 21 de dezembro; somente os que acreditassem no aviso seriam resgatados por disco voadores. Festinger e alguns colegas da universidade de Minnesota conseguiram o acesso aos membros do grupo e os entrevistaram antes do apocalíptico evento, e novamente após a data fatídica, quando os eventos não se confirmaram. O hoje célebre estudo de Oak Park sobre o grupo homônimo, publicado por Festinger, Henry Riecken e Stanley Schachter em When prophecy fails, descreve as reações dos membros do culto. Embora o senso comum nos leve a supor que, diante do fracasso das previsões e a consequente dissonância cognitiva, eles abandonariam as convicções, o oposto aconteceu. Quando se aproximava o dia do juízo final, outra “mensagem” veio dos céus, anunciando que, devido à dedicação do grupo, a Terra seria poupada. Os membros do culto transformaram-se em fieis ainda mais fervorosos. Festinger previra isso: aceitar a evidência contraditória causaria uma dissonância ainda maior que a crença do passado e a negação do presente, segundo ele. Esse efeito era ainda muito mais intenso se a crença original pusesse muita coisa (reputação, empregos e dinheiro) em jogo. Festinger concluiu que a dissonância cognitiva, ou ao menos a prevenção dela, torna um homem de convicções profundas incapaz de mudar de opinião diante de uma contradição; ele é imune a evidências e argumentos racionais. Nas palavras de Festinger, “diga que discorda, e ele lhe dará as costas". Mostre fatos ou números, e ele questionará suas fontes. Apele para a lógica, e ele será incapaz de entender o seu raciocínio”.  (O Livro da Psicologia, 2014, página 167):

Os órfãos que votam na Marina possuem o mesmo comportamento do culto exemplificado por Festinger, em que o autoengano proclama tapear o conceito para defender a crença. Pois, os fatos são os seguintes:

Marina é ex-petista;
Marina já vestiu boné do MST;
Marina está no partido PSB, que está no FORO DE SÃO PAULO;
Marina não gosta do agronegócio;
Marina é esquerda;
Marina não gosta do PSDB.

Portanto, por motivo óbvio ululante, Marina Silva não é oposição.

Mas Marina, por hora, “fala a minha língua”. O problema é que entre falar a língua e “governar para mim” há uma distância abissal em execução. Para “governar para mim”, Marina terá que ir contra toda a crença que vem desde o período de adolescência, para ter que fazer situações em que me satisfaça, deixando de lado os interesses dos companheiros de caminhada da esquerda. Com certeza absoluta Marina não deixará de lado toda essa convicção, mesmo que mantenha a mesma política tacanha e fracassada do PT, pois outros sentimentos psicológicos entram em vigor, impedindo tal concretização.

Onde ficaria o orgulho, pois teria que reconhecer que sempre acreditou no errado, que o oponente de Marina sempre esteve certo e que agora teria que reparar um erro histórico? E para consertar tal injustiça, o certo seria colocar o PSDB na presidência, por motivos óbvios. Marina elogia FHC sem ser tucana, sem dividir palanque com tucanos, copiando até mesmo programa dos psdbistas, sem o menor pudor, fingindo ser o que não é de forma pura, pois não é uma social democrata de fato.

Os eleitores que se enganam são iguais a Marina, no qual estão ressentidos com o PT, mas são incapazes de mudar de opinião: ser contrário ao PT de fato, votando na "sonhática" como oposição. E são tantos ex-petistas perdidos que poderá fazer Marina “presidenta” da nação.

A lógica retilínea, de tabula rasa ou papel em branco, fazia sugestão que se o PT foi descartado, ao natural o PSDB subiria ao poder, por ser a verdadeira oposição. Mas como a lógica não é monopólio humano de decisão, cristaliza-se a emoção que ecoa como Marina opositora, que é igual os pares que estão no poder, mudando somente os atores políticos, com a peça teatral sendo a mesma.  

Dizem que critério de loucura é fazer a mesma coisa e querer resultados diferentes. Marina fará o mais do mesmo, mas o autoengano dos órfãos ilude que tal assertiva, a mudança somente de político, com o arranjo sendo mantido, é sopro de mudança e melhoramento da situação econômico social.

O que fazer para convencer “autoenganados” órfãos a mudar de opinião? Não há o que fazer nesse aspecto, apenas esperar mais uma decepção e ver, quem sabe, se daqui a quatro anos o “povo” mudará de opinião. Portanto, a sonhática quer um governo arco-íris. Acabará criando um mandato Frankenstein.

Se o problema recai na paralaxe cognitiva, num desvio emocional, em que a convicção reforma a cada instante para favorecer a crença, infelizmente não há o que fazer sobre tal seara, somente esperar o mais do mesmo, mais quatro anos perdidos pela vã esperança de um milagre eleitoral.

O autoengano dos órfãos causará paralisia nacional.

Marina Silva, economicamente, fala como Rodrigo Constantino, mas fará governo tipo Miriam Leitão.

É apostar e esperar pra ver.

  
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O Autoengano dos Órfãos de Júlio César Anjos está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
Baseado no trabalho disponível em http://efeitoorloff.blogspot.com.br.

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