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A Torradeira



Por: Júlio César Anjos

A sociedade chegou a um nível sem igual, a torradeira virou artigo de status, todas as pessoas passaram a buscar tal eletrodoméstico como objeto de valor maior do que a utilidade, em si, do produto. O equipamento começou a aparecer com designers dos mais variados, para todos os gostos e bolsos, mercado pujante através de uma mercadoria totalmente substituível, o que traça uma bolha no ramo de atividade. Tudo correria normalmente, até que os burocratas resolveram atacar tal seguimento.

O governo, vendo o crescimento de consumo em tal concepção, resolveu instituir o que chama de tributo, um imposto chamado ISET (Imposto Sobre Equipamentos Tostadores). Tal medida instigou debates e mais debates Brasil afora, todos convergindo sobre preceitos do Estado. O novo tributo afetou também as linhas de chapas e algumas prensas de cozinha e siderurgia.

Os políticos, através de mudanças no código tributário nacional (CTN), resolveram fazer debates sobre o fato gerador do produto, quanto deveria ser alíquota da mercadoria, a base de cálculo e quem deveria ser o recolhedor - o pagador do tributo. O congresso vira  um inferno. Os políticos do governo tentam fechar o acordo em 20% (Vinte porcento) de alíquota, enquanto que os opositores tentam fechar em 10% (Dez porcento). Ao passo que, para entendimento de todos os envolvidos, o acordo fechou em 15% (quinze porcento). Quem recolheria o imposto seria o proprietário do tostador, uma vez por ano, com 15% (Quinze porcento) sobre o valor de venda da torradeira no primeiro ano, com mudanças de valor conforme a depreciação do produto no mercado, como parte fixa da alíquota de 15% (Quize porcento) ao valor do produto, na base de cálculo, desgastado durante o tempo. Ou seja, 15% sobre o valor da torradeira no mercado.

Os intelectuais das universidades dos piolhos, como se fossem mercados das pulgas, debatem sobre as novas mudanças da CTN, o que mudaria na vida das pessoas no curto prazo, como se o tributo salvasse o país, tratando o seguimento da burocracia como uma alavancagem do sucesso nacional. Estudantes que não pensam fazem perguntas sobre questões específicas da situação momentânea, como, por exemplo, as penalidades que o recolhedor de impostos teria se não recolhesse tais tributos. Eis que aparecem os magistrados.

Os magistrados tratariam sobre questões das penalidades em não pagar tributos, as isenções, as decadências em casos específicos, desde que exista tratamento na constituição e outras ferramentas burocráticas, como o CTN, decretos, medidas, portarias e etc. Os juízes, então, pensando sob a letra fria da lei, somada com entendimentos de jurisprudência, determinariam a absolvição ou punição de pessoas físicas e/ou jurídicas que tivessem erroneamente não recolhido os impostos devidos. Agora aparecem leilões sobre as torradeiras, pregões eletrônicos e mais burocracia para obter ou fabricar torradeiras no país.

O Inmetro aparece agora para criar uma característica de padrão brasileiro de torradeira, para minimizar os problemas ocasionados pela falta de qualidade dos equipamentos. O PROCON, com base na suposta falta de qualidade do produto, além dos problemas ocasionados pelas vendas, resolve abrir um setor específico de torradeiras, para fornecer um melhor serviço ao cliente ocasionalmente lesado.

Os fabricantes, ao ter que se adaptar ao novo sistema, encarecido pela burocracia, vai à porta do governo pedir subsídios e protecionismos, já que os produtos concorrentes que vêem da China são mais baratos e com a qualidade similar ao nacional. O governo atende  à reivindicação, propõe desoneração da folha de pagamento, redução do IPI (Imposto sobre produtos industrializados), com aumento de II (Imposto de importação), além de barreiras não tarifárias, como, por exemplo, os produtos que só podem entrar ao país se tiverem alguns componentes nacionais e/ou coadunassem com o padrão de qualidade brasileiro.

Os sindicatos resolvem entrar na jogada, colocam o operário como manada, e atravessam o lucro do empresário sem o menor pudor, com a alcunha de defesa ao empregado que merece PLR (Participação de Lucros sobre o Resultado) ou qualquer coisa do gênero. Agora aparecem as paralisações, as chantagens operárias, a improdutividade e a perda de competitividade da indústria no país. Os sindicatos recebem apoio de ONGS (Organizações Não governamentais), que trazem índices de ferimentos e até mortes das torradeiras nas residências, como se fossem mortais e inimigas de toda uma nação. ONGS e Sindicatos gritam aos montes que a culpa é do capitalista.

A interferência do governo deixou o setor travado burocraticamente, improdutivo, e, juntando a falta de escolaridade do país, medíocre na criação de novas torradeiras. A indústria de torradeiras agoniza porque, além de tais problemas, o mercado de torradeiras desacelera, criando volatilidade no setor. Já se fala em falências, o empresariado não agüenta mais tanta pressão e, para consertar o erro, o governo decide colocar panos quentes e resolver o problema nos bastidores.

O governo que até então burocratizava resolve desburocratizar com medidas provisórias e decretos; Os políticos resolvem isentar o setor de impostos a fim de salvar o pátio fabril; os intelectuais resolvem desenterrar idéias libertarias para salvar a indústria; O Inmetro agora faz vistas grossas sobre a qualidade do produto; o PROCON finge que não vê algumas reclamações; as ONGs param de latir; e o Sindicato aceita fazer qualquer acordo, até mesmo demissão em massa, desde que o capitalista não feche a porta do negócio, pois a torradeira deixou de ser status e o mercado está em declínio.

 E após toda a confusão provocada pela convulsão de Estado, descobre-se que o governo nunca deveria ter entrado no ramo de atividade, de forma alguma, pois é o criador de qualquer crise.

E se você acha absurdo criar imposto por simplesmente ter uma torradeira, por que não acha insano tributar carro, apartamento e bem tangível de qualquer natureza? Fica a pergunta retórica.

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O trabalho A torradeira de Júlio César Anjos foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.
Com base no trabalho disponível em http://efeitoorloff.blogspot.com.br/.

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