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A Influência Ensandecida


Por: Júlio César Anjos

Acorda no banco da praça, fricciona o rosto, estica os braços e olho para o horizonte.  Dimas pensa como chegou ali, mas esquece do passado e o futuro acena, dá oi, e flerta para novas aventuras. Com o traje do corpo, poucas roupas emboladas em uma mochila, o sujeito caricato caminha pela cidadezinha interiorana, a fim de fazer procuras, está na hora da busca e apreensão daquilo que a ele pertence. Procura um estelionatário.

A cidadezinha é pacata, pequena, e uniforme, sem sujeira nem come-e-dorme, apenas pessoas vivendo de forma sutil, como se fosse uma pintura viva de Van Gogh. De turvo somente as mãos, inchadas, e, às vezes, as chuvas que contribuem para hostilizar a suavidade da cidadela normalmente inalterada. Os moradores são dóceis, parecem bichinhos de estimação de madame. Poucos falam, muitos fazem, colaboram uns com os outros, pois se conhecem desde que existem.

O ambiente bucólico da região contrasta com o vivencial do viajante, bem como a rotina do estelionatário que se acredita estar escondido em tal localidade. Loquaz, o itinerante elócubro deriva aos curiosos sobre os pormenores do estelionatário: Diz não se perigoso, embora persuasivo, ataca indefesos de forma singular, não aparece em registros nacionais, por se tratar de um bandido internacional. Sem perspectivas, e nem dinheiro, diz que o estelionatário está foragido na casa de um familiar, o que clareia os indícios do viajante, já que em uma conversa informal, o estelionatário deixa escapar tal cidade, além de deixar pistas sobre a veracidade do fato.

Dimas é um bom sujeito, com os opcionais de fábrica que coadunam com as especificações técnicas da região, um encaixe natural ao eventual que sentenciou, pois, de outra forma, Dimas poderia nunca saber que existia a cidade. Ao porte de um lápis e uma caderneta, Dimas porta-se de investigador experiente, faz interrogatórios à luz do dia, no meio fio, para não atrapalhar o trânsito inexistente da rua. Faz perguntas cotidianas como: Se viu alguma coisa ou alguém diferente? Se viu alguma movimentação estranha? Coisas desse gênero.

 A fome bate, o estomago ronca, o suco biliar incomoda, de gastrite talvez – sabe-se lá o que – já que se alimentar não é o forte dele. Vai para o melhor restaurante da cidade, que é o único, faz o pedido, no mesmo tempo que conta as moedas. A garçonete, que é a dona do local, sensibiliza-se da situação, e diz que naquele momento era por conta dela. Conversa vai, papo vem, Dimas fala sobre aposentos, já que se não achar, pode ser que durma ao relento, á sinfonia das anuras. Satisfeito, o viajante vai à busca da procura.

Na esquina da cidade, depara-se com uma senhora de idade, com a graça contada ao tatear das rugas, cicatrizes da experiência, marcas aparentes, talvez, de felicidade, gozada de uma vida muito bem vivida. A conversa a revelia demonstrou mais uma vitória ao bem socializar, a velhinha dedica a garagem da casa aos aposentos do viajante, caridade aos olhos de estranhos, somente moradores de cidades inocentes poderiam praticar. O viajante, agraciado, fica emocionado por saber que existe ainda humanidade.

No outro dia, após comer e dormir na casa da velhota, Dimas continua a saga, detetive particular dele mesmo busca indícios, provas ou qualquer coisa que mostre onde está o estelionatário, quer resgatar o dinheiro de volta ou prendê-lo por crime de ordem financeira. Ao “entrevistar” uma moça, a astúcia do coração agita em contemplação, movimentos não controlados exorbitam no ambiente astral do momento, aflorando sentimento e desejo natural. Amor a primeira vista?

Tudo acontecera em apenas uma semana, tempo pequeno para adaptação cômoda de um viajante em uma cidade. O local afagou o sujeito, abriu as portas e o sorridente Dimas agora tem um lugar em que sonhou desde criança. Mas o objetivo dele não tinha acabado ainda, o viajante continua a saga, convicto que o estelionatário está na cidade, na sua cabeça o estelionatário está com certeza na pequena cidade, mesmo que todos os moradores achem que não.

Após passar 2 semanas, aclimatado na região, Dimas chama todos para irem até a casa abandonada da cidade, dizendo a todos os cantos que o estelionatário estava escondido ali, chegou o final da saga e tudo estaria definido. Aos clamores, Dimas faz barulheira e pede para alguns irem junto com ele para desmascarar e deflagrar o esconderijo do nefasto, mas acontece o fenômeno de cidade pequena e todo mundo vai espiar o ocorrido, já que nada acontece naquela cidade, e qualquer mudança do status quo faz ser um diferencial na região, acaba virando novidade.

Dimas convida a todos a estarem n casa abandonada, pois mostrará que dentro do domicílio há um esconderijo, lugar onde está o estelionatário. Todos estão apostos próximos a casa, o viajante faz um pequeno discurso e liga para a polícia. A polícia rapidamente chega, até porque a cidade é pequena, e, para surpresa de todos os moradores. A polícia dá voz de prisão:

Você está preso. Indo em direção a casa, os policiais prendem Dimas, para a surpresa de todos. Aproveitando a deixa de todo mundo estar ali, o policial explica a situação, diz que o rapaz é um viajante sim, mas possui domicílio em um sanatório, é um maluco fugitivo.

Todo mundo fica perplexo, afagaram um louco, deram comida, alojamento, e até carinho, para uma pessoa que não era muito certa da cabeça. Toda a comunidade ficou a refletir sobre tudo: A inocência, a facilidade em ser convencida, influenciada, e feita de manobra, a facilidade em acreditar em um doente mental, nas interações feitas por uma pessoa que pela aparência destinava a conclusão de ser inofensivo, e etc. Tudo foi passado a limpo, e, depois daquele dia, até mesmo deputados estaduais sofriam resistência em convencer a cidadezinha que ficou resignada.

A influência ensandecida do viajante foi o maior ensinamento que aquela cidade tinha recebido até então. Os moradores aprenderam que confiança deriva tempo.

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Com base no trabalho disponível em efeitoorloff.blogspot.com.br.


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