Por: Júlio César Anjos
Algumas mazelas provocadas por infortúnios dão a entender que a dor é
somente sofrida, um objeto de tortura àqueles que já passaram pelo sentimento
caótico de tal angústia, seja físico ou mental.
A dor possui ramificação e cada via expressa um fim. A única dor sofrida
é a dor que a pessoa sente ao morrer. A dor da morte é sofrida sim, pois, além
de ceifar a vida, provoca dor na própria pessoa e nos entes queridos. Todas as
outras dores são sensações que chegam a ser boas para as pessoas.
Uma dor provocada por uma espetada de agulha por um enfermeiro, gesto
bondoso da doação de sangue, é uma dor bonita pelo simples fato da dor não ser
terminal, nem letárgica, apenas pontual, para satisfazer a filantropia em
ajudar outrem.
A dor do parto é para a mãe o momento de sensação desagradável, mas no
fim reporta a um prazer sem igual, dádiva dos deuses em tornar real mais uma
vida na terra. A dor do parto é a explosão de sentimentos em um mesmo momento,
o êxtase que somente a mulher materna pode explicar. Mas garanto que o fim da
dor e o aparecimento do filho é algo sem igual.
Um sexo sem ser forçado traz a nós o desconforto da penetração. As
mulheres, às vezes, sentem prazer em uma dorzinha bem pequena, tão ínfima que
só leva a remeter a orgasmo e nada mais. Não é a dor de estupro, não confundam
as coisas, é o encaixe perfeito com um mínimo de aperto que faz a glória não
somente para o homem, mas para a mulher também.
Ah, quem nunca tirou um espinho? Aquela dor do espinho que dá um friozinho
na barriga não é de todo mal, mas tirar o espinho que o incomodava durante
certo tempo faz a dor ser prazerosa pro acabar com a mazela. Sensação maravilhosa em
tirar um espinho e poder mover o membro que, até então, estava combalido.
A dor em mexer no dente, quando criança, e sentir aquela sacolejada de um
lado para o outro a fim de tirar o dente que atormenta é algo muito bom. Quando
criança a retirada do dente não é tão dolorido e a sensação é de conforto, de
fim de uma era e de uma encheção de saco, troca-se o dente de leite pelo dente
definitivo. Todos também já sentiram essa dorzinha de dente ao cair.
Os ossos do ofício em obter a dor da tatuagem para criar um desenho
bonito no corpo são prazerosos para o tatuado. Só quem tem tatuagem para saber
que passou pelo crivo da dor da agulha de tinta para chegar ao objetivo final:
a tatuagem concluída. A dor da agulha no corpo vale a pena porque faz uma troca
com a própria pessoa por um desenho bonito no corpo.
Mas não há só as mazelas físicas de contrapartidas que são feitas as
dores. As dores sentimentais podem ser boas para cada indivíduo também. As
sensações desagradáveis não físicas estão a todo o momento nos machucando,
basta saber verificar e entender que, mesmo machucando sentimentalmente, as
dores são até boas porque nos responde a várias perguntas.
O time ganhar todas as partidas e no último jogo perder a final para o
adversário é, por todas as razões, uma dor boa. Até porque é uma dor de um
fracasso lutado, de uma infelicidade de apenas um jogo, e remete que a equipe
possui qualidade para continuar a trilhar o mesmo rumo e manter-se vencedor.
A mãe ao bater no bum bum da
criança e sentir aquela dor no peito em ter reprimido uma ser indefeso,
desfruta de uma dor no coração de fazer algo que é ruim naquele momento, mas
educará o filho para o futuro. Um tapinha no bumbum faz a criança sentir a dor
física e a mãe uma dor sentimental, o flagelo dos dois lados das partes.
A partida de um ente querido é uma dor sofrida somente naquele momento do
adeus no caixão, e algumas lembranças vagas a posteriori na cabeça daqueles que
ainda lembram-se do ente querido que faleceu. Mas não se esqueça que o
espírito conforta em outro plano e a dor da vida não o faz mais presente a ele,
então é uma dor que não transcende, é mazela momentânea, e bonita sim, pois faz
parte do processo da vida.
Por fim, a dor mais bonita de todas é a relacionada aos sonhos. A dor em
não conseguir realizar o sonho, e, de uma hora para outra, ficar sabendo que
tudo será uma ilusão no futuro, faz com que as pessoas o magoem por falar
verdades, fatos que machucam na hora, mas faz o sonhador cair na real. Dor do
fim de um sonho, caindo na real, com a possibilidade de ser feliz mesmo assim,
é a melhor dor que pode acontecer a alguém.
A única exceção de infortúnio é a dor terminal sofrida por doença seguida de morte. A dor por
doença que leva ao óbito machuca a todos os envolvidos, seja os próximos da
sociedade, familiares, ou etc. A dor de uma doença que leva ao óbito é exceção
das dores que sentimos no dia-a-dia, mas faz todas as outras dores levarem a
fama de serem ruins. Mas nem todas as dores são ruins.
O trabalho As dores bonitas da vida de Júlio César Anjos foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição - NãoComercial - SemDerivados 3.0 Não Adaptada.
Com base no trabalho disponível em efeitoorloff.blogspot.com.
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